Nos últimos dois anos a fintech Neon – que é uma instituição de pagamento, não um banco – saiu da dupla conta e cartão para um leque mais amplo de serviços financeiros, com destaque para a oferta de crédito. Com mais gente usando mais produtos a companhia chegou a R$ 120 bilhões transacionados em 2023, e viu sua receita mais que dobrar. A base de clientes está na casa dos 30 milhões.
A expectativa é que o ritmo de expansão se mantenha em 2024, o que faz a companhia enxergar um caminho para fechar as contas no azul. Segundo Fernando Miranda, copresidente da Neon, a lucratividade será alcançada este ano. “A receita média por cliente ativo (ARPAC) triplicou de dois anos e meio para cá. A gente começa agora a maximizar valor para essa base de 30 milhões de clientes”, completa.
Com R$ 4 bilhões em carteira, a fintech tem visto grande demanda por produtos como o CDB que paga 150% do CDI e o Viracrédito. Este último, segundo Fernando, traz de 80 mil a 100 mil novos clientes por mês, oferecendo limite de empréstimo atrelado a investimento.
No caminho de aumentar o uso pela base, a Neon resolveu fazer uma reformulação geral do seu aplicativo, algo que nunca tinha sido feita em quase uma década de história. A ideia foi facilitar o uso e também integrar as operações da MEI Fácil, Leve, ConsigaMais+ e Biorc, que compõem o portfólio da fintech. O processo incluiu também mudanças da porta pra dentro, na arquitetura tecnológica da instituição, para permitir maior flexibilidade na criação de novidades. “Podemos pensar em um experimento pela manhã e à tarde já está no aplicativo”, diz Fernando.
Para o cliente, a nova cara do aplicativo traz uma experiência mais rápida (o Pix mais rápido do Brasil, segundo eles) e também personalizada. Com base na forma como o cliente usa os serviços, o aplicativo vai se adaptar deixando mais acessíveis recursos mais usados e tirando da frente o que é menos importante. Isso é feito usando… já sabe né?… machine learning, que é uma vertente da inteligência artificial. Mas Fernando diz que prefere não usar o termo diretamente para não parecer tão hypado.
Uma novidade interessante é o lente Neon, um recurso que permite mirar a câmera do celular para um número Pix anotado em um papel e fazer uma transferência. O próprio Fernando conta ter usado o recurso no fim de semana para pagar o sorvete das filhas na praia. “Tem essa coisa de fazer as coisas complexas, super app. Mas será que é esse o caminho mesmo? Para a vendedora de sorvete 10 segundos podem fazer a diferença. Fizemos muita pesquisa para os produtos terem simplicidade”, explica. Segundo ele, o processo de desenho do novo aplicativo levou cerca de oito meses para ser concluído.
Neon é banco ou Big Tech?
Enquanto outras contas digitais se voltaram aos universos das empresas e da alta renda, a Neon centrou seus esforços em um público que ela chama de “trabalhador brasileiro”. O contingente de 100 milhões de pessoas é, na avaliação de Fernando, um oceano azul, já que é menos disputado e numeroso que o público endinheirado – que não deixa de ser bem-vindo na Neon, diga-se de passagem.
Mas se traz uma oportunidade, o foco também vem com um desafio: a disponibilidade financeira desse público também é mais restrita, o que, a princípio, restringe a capacidade de monetização. Para enfrentar esse dilema, Fernando diz que a Neon investe pesado em tecnologia para aumentar sua eficiência. “Um custo de servir extremamente baixo não é um luxo, é uma necessidade para ter um modelo de negócio que eu consigo ganhar dinheiro mesmo com receitas mais baixas. Eu preciso gerar resultado para um cliente que gera R$ 60, R$ 100 ou R$ 10 de receita”, diz.
Essa mentalidade de Big Tech, como Fernando chama, se reflete no core banking desenvolvido dentro de casa e na equipe de tecnologia de 30 pessoas alocada no Vale do Silício sob o comando do CTO André Madeira, um ex-Google, Snap e cofundador da Meemo, vendida para a Coinbase em 2021. “Hoje eu posso adicionar 10 milhões de clientes com o mesmo custo”, se gaba Fernando.
Com 1,8 mil funcionários, a Neon fez duas rodadas de demissões ano passado. Na primeira rodada, em fevereiro, foram dispensadas cerca de 130 pessoas. Em outubro, outras 80 foram cortadas. “A Neon fez ajustes necessários no seu quadro de colaboradores. A decisão foi tomada por uma questão estratégica, pensando em entregar nossas prioridades de negócios ajustadas e alinhadas ao ciclo de crescimento com eficiência operacional. O movimento foi difícil, mas fundamental para Neon preservar a sustentabilidade do negócio”, afirmou a companhia em outubro.
Segundo Fernando, ao longo de 2024 a Neon não tem planos de ampliar tanto sua oferta de produtos. A conquista de novos clientes vai acontecer, mas a ampliação da base não é o principal objetivo. A estratégia é mesmo ampliar o uso do que já está disponível por quem já está dentro de casa.