Inovação

Como o Amapá quer figurar no mapa da inovação no Brasil?

Ao receber o Startups20, estado do Norte quer fazer barulho e se firmar como referência de inovação na Amazônia

Startup20 em Macapá
Startup20 em Macapá. Crédito: divulgação

“Por quê o Amapá?”. Ao receber o convite para o primeiro encontro do Startup20 no Brasil, essa foi a pergunta que surgiu aqui na redação. “Essa foi a pergunta que ouvi diversas vezes, todos os dias”, disparou Ingrid Barth, presidente da Abstartups, entidade organizadora do evento, com conversa com o Startups.

Macapá foi escolhida como a primeira cidade brasileira a sediar a agenda do Startup20 – o grupo de engajamento dos países do G20 tem outros eventos confirmados em São Paulo e Rio de Janeiro para este ano. Segundo os organizadores, cerca de 400 pessoas foram esperadas para a ocasião, entre representantes de delegações internacionais, autoridades e empreendedores de outros estados e integrantes do ecossistema de inovação da capital amapaense.

Mas voltando à pergunta inicial, ao fazer o Startup20 em Macapá, o plano é mostrar in loco o cenário de inovação e empreendedorismo da região, algo que surgiu longe dos holofotes e condições mais favoráveis vistas em outros estados. “Estamos falando de mercado, de criar um ambiente propício para empreender. Precisamos de incentivos, mas não vamos ficar esperando. Estamos incentivando, chamando a atenção e convidando gente do mundo inteiro para conhecer o que há por aqui”, afirmou o Governador do Amapá, Clécio Luis, durante o evento.

Ingrid Barth, presidente da Abstartups, durante o Startups20 (Crédito: divulgação)
Ingrid Barth, presidente da Abstartups, durante o Startups20 (Foto: Divulgação)

Segundo dados levantados pelo Sebrae entre 2022 e 2024, o ecossistema amapaense tem cerca de 84 startups, gerando cerca de 500 empregos diretos e indiretos e gerando mais de R$ 10,2 milhões em faturamento em 2022. É um número pequeno em comparação com grandes centros do país, mas levando em conta o tamanho da população local (800 mil pessoas), não deixa de ser notável. Com estes números, Macapá se firmou como a 2ª capital da região Norte com maior número de startups (17,4%), só perdendo para Manaus (32,2%).

Além disso, segundo a própria presidente da Abstartups, o cenário de inovação no Amapá mostra um engajamento acima da média. “Eu queria muito fazer uma reuniao do Startups20 na Amazônia, cheguei a visitar outros estados, e vi que o Amapá tem um ecossistema de inovação muito maduro”, destacou Ingrid, respondendo um pouco à pergunta do começo deste texto.

Fazendo barulho

De acordo com Lindomar Góes, um dos fundadores da startup amapaense Proesc, e membro fundador do Tucuju Valley, grupo de empreendedorismo local, fazer o Amapá aparecer no mapa da inovação é uma batalha que foi travada “no grito”. Quando a gente começou, não tinha nada. Mas sempre fizemos muito barulho, o que chamou a atenção do Sebrae, passando a ter programas como o Startup Macapá, que agora é Startup Amapá”, pontua Lindomar, em entrevista para o Startups.

O empresário acrescenta que, depois de quase dez anos de atuação, o Tucuju Valley saltou para cerca de 100 startups conectadas (número maior do que o mapeamento do Sebrae), com dez delas já escalando, e nomes como a Proesc e Tributei puxando a frente, inclusive levantando investimentos junto a fundos nacionais.

No ano passado a Proesc levantou R$ 8 milhões em uma rodada seed liderada pela Square Knowledge Ventures, fundo especializado em startups para educação – a maior rodada levantada por uma startup na região da Amazônia. Com seu ERP voltado à gestão escolar, a companhia faturou R$ 13 milhões em 2023, crescendo 42,3% ante os R$ 7,5 milhões de 2022. Para Lindomar, o plano para 2024 é bater na casa dos R$ 20 milhões em receita, visando uma nova rodada a partir do próximo ano para tocar seus planos de expansão internacional.

Entretanto, até chegar nos investimentos, a Proesc teve que se virar. “A gente atuou muito tempo em bootstrap, porque aqui no Amapá é diferente. A Amazônia como um todo é diferente do sul e sudeste, que atua na abundância. A gente atua na escassez”, explica

Para não apenas atrair investidores, mas também entender como um mercado desconhecido para a realidade amapaense, o CEO da Proesc – e sobrinho de Lindomar – Felipe Ferreira, teve que se mudar para São Paulo, o que foi essencial para abrir caminhos para a startup. “Compramos um número 011 para a gente ligar para os clientes como se fosse em São Paulo. Porque quando a gente ligava com prefixo do Amapá, de cada 100 apenas 5 ou 6 atendiam. Quando a gente começou a ligar de São Paulo a taxa de atendimento era muito maior”, explica.

Lindomar Góes, Felipe Ferreira e Elias Teixeira, sócios e cofundadores da Proesc. CRÉDITO Erich Macias
Lindomar Góes, Felipe Ferreira e Elias Teixeira, sócios e cofundadores da Proesc (Foto: Erich Macias/Divulgação)

Entretanto, a empresa nunca pensou em sair de seu estado natal. Aliás, segundo Lindomar, o plano é aproveitar o sucesso da Proesc para inspirar outros empreendedores locais e ampliar a cena de inovação local. “Hoje a gente liga com 095 (prefixo de Macapá) e dizemos com muito orgulho que nós somos do Amapá, que somos a maior startup da Amazônia com muito orgulho”, dispara.

Novos caminhos

Tanto para os empreendedores locais, quanto para entidades e o governo do Estado, a realização do Startup20 em Macapá tem tudo para ser um divisor de águas para o empreendedorismo local, mas o plano não é ficar só nisso. Segundo o governador Clécio Luis, a partir do diálogo com outros estados e países, o grande objetivo do estado é casar o maior ativo local – a Amazônia – com tecnologia, empreendedorismo e sustentabilidade.

“O plano é mostrar o Amapá, mostrar inovação ao mundo, aproveitando o contexto da economia verde, e se tem um lugar para fazer isso, esse lugar é o Amapá”, pontuou Clécio. Inclusive, durante a abertura do evento, os governos Federal e Estadual anunciaram um investimento de R$ 4,25 milhões em startups amapaenses, por meio do edital Tecnova 3.

Governador do Amapá, Clécio Nunes, assina termo de investimento em startups locais (Crédito: divulgação).
Governador do Amapá, Clécio Luis, assina termo de investimento em startups locais (Foto: Divulgação).

Para Lindomar, este fomento chega em um momento importante para o estado, ajudando a criar a base para outras “Proescs” tenham a chance de crescer e aparecer. Segundo o empresário, é um desafio de longo prazo, até porque estamos falando de um Estado cuja capital tem mais de 40% de sua população vivendo em situação de pobreza.

“Como eu te disse no começo, a Amazônia toda atua na escassez, nossa região representa 5% das startups do país. Nós estamos em uma fase anterior ainda a investimentos (de VC), ou crédito. Se a gente quiser acelerar esses 5% para chegar pelo menos em 10%, pelo menos em 20%, a gente precisa trazer fomento junto com conhecimento. Os dois têm que andar junto”, diz.

Segundo o fundador da Proesc e o governador amapaense, trazer os olhos do país e do mundo para o Amapá e para a inovação na Amazônia é um movimento sem volta. “Uma vez que você vê, não dá para desver. Então, o Amapá nunca mais vai ser o mesmo, sabe, depois do Startup20. Primeiro, por conta desses olhares que estão vindo de fora, e segundo, muda até a visão de quem mora aqui”, avalia Lindomar.

“Durante toda a existência do Amapá tínhamos um problema de isolamento físico do restante do país. Agora, com a tecnologia, o desafio de estar distante dos grandes centros deixa de existir”, completou Clécio Luis, chamando a atenção sobre as discussões de inovação envolvendo a Amazônia. “Nada sobre nós, sem nós. Não aceitamos mais que se fale da Amazônia, sem nós”, finaliza.

*Leandro Miguel Souza viajou a Macapá para o Startup20 a convite da Abstartups.