IA | Foto: Canva
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A euforia inicial com a inteligência artificial tem começado a dar lugar a uma certa impaciência das empresas com os retornos sobre esses investimentos. Estudo da consultoria McKinsey, publicado em novembro, mostra que 88% das empresas já usam IA em pelo menos uma função. No entanto, apenas apenas 39% relataram um impacto mensurável no lucro operacional com a adoção da tecnologia.

Apesar de o investimento em IA ser importante para manter as empresas competitivas, analistas ouvidos pelo Startups apontam que os retornos nem sempre vão aparecer na velocidade que as companhias desejam. Entre os fatores que influenciam a capacidade de geração de lucro com a IA estão, por exemplo, o setor de atuação, a curva de adoção e aprendizado, e as próprias limitações da tecnologia, que ainda está em fase de experimentação e desenvolvimento.

“As empresas esperam ganhar mais ao investir em agentes de IA, não ganhar menos. Então existe do ponto de vista de business essa dificuldade de que as companhias podem melhorar a qualidade do serviço, podem melhorar a produtividade, mas não necessariamente vão reduzir o custo. A gente ainda está na infância de como justificar esse investimento em IA”, afirma Pedro Bicudo, analista da consultoria ISG.

O relatório “The State of AI in 2025: Agents, innovation, and transformation” da McKinsey mostra que a maioria das organizações ainda está na fase de experimentação (32%) ou pilotos (30%), com apenas cerca de um terço escalando iniciativas de IA em toda a empresa (38%) – o que limita o impacto financeiro em nível de lucro operacional.

Mesmo nas empresas que já estão implementando IA de forma mais avançada, os retornos podem não estar vindo na velocidade esperada. Pedro Bicudo explica que, em geral, os impactos mais rápidos na redução de custo das empresas vêm do corte de pessoal, algo que ainda não tem sido feito em larga escala pelas companhias. Ou seja, a ideia de que a IA roubaria os empregos ainda não está acontecendo.

A maior parte dos respondentes do estudo relatou pouca ou nenhuma mudança no número de funcionários em decorrência do uso da tecnologia no último ano. No entanto, uma proporção maior espera mudanças no número de funcionários no ano que vem em funções como RH, engenheiros de software, TI, operações, entre outras.

Considerando as diferentes áreas de negócio, em média 32% dos respondentes esperam queda no tamanho da força de trabalho no próximo ano como resultado do uso de IA, enquanto 17% esperam aumentos no número de contratações. Para 43%, porém, não haverá mudanças.

“Eu não acredito que a IA vá tirar empregos, mas os trabalhadores terão uma produtividade maior. Talvez em cargos júnior haja um impacto maior, porque os funcionários passam a produzir mais e melhor por mais tempo”, avalia Pedro. “O problema é que é mais fácil justificar um projeto de TI quando ele corta custos”, acrescenta.

Para Alexandre Pires, professor de Economia do Ibmec-SP, os impactos no mercado de trabalho dependerão em grande parte do segmento da indústria. Segundo ele, setores muito intensivos em mão de obra, como atendimento ou manufatura, conseguirão sentir mais rápido os efeitos da IA. Ainda assim, ele destaca que para que esses efeitos cheguem à economia real, será preciso haver um acoplamento da IA que se conhece hoje, que é software, com a indústria 4.0, que é hardware.

“Tem capacidade de IA sendo instalada, mas por enquanto o hardware somos nós mesmos. E o ser humano é o ser humano. Posso até fazer uma pesquisa mais rápida usando IA, por exemplo, mas isso não muda o fato de que vou ter que escrever um texto. E, como sou humano, não vou conseguir publicar 20 textos por dia”, explica.

Embora o potencial da IA seja indiscutível, Alexandre aponta que a tecnologia ainda é cara e oferece poucas vantagens em termos de otimização do trabalho. Por ser uma tecnologia nova, a IA ainda depende da supervisão humana, o que pode acabar gerando uma sensação de retrabalho. Além disso, ainda não é possível confiar às máquinas a execução de tarefas mais complexas.

“Hoje eu não consigo projetar um prédio usando IA, por exemplo. Pode ser que daqui a cinco anos eu consiga a computação necessária para fazer isso com custo muito baixo. Mas ainda não é essa a realidade. A IA que vai fazer a diferença é extremamente cara. E as empresas estão justamente preocupadas com isso. Ou seja, o tanto de processamento e capacidade elas precisam ter para que a IA substitua pessoas e equipamento, sendo economicamente viável”, aponta o professor.

Mais investimento, mais retorno?

O estudo aponta que, frequentemente, as organizações abordam a IA a partir de uma lógica centrada principalmente na redução de custos, mas destaca que, embora muitas já percebam indicadores iniciais de ganhos de eficiência, focar apenas nesse aspecto pode limitar o impacto da tecnologia nos negócios.

O relatório da McKinsey destaca que as empresas classificadas como “high performers” em IA – aquelas que conseguem gerar valor financeiro acima da média – adotam uma abordagem distinta. Em vez de tratar a IA apenas como uma ferramenta de redução de custos, essas organizações a posicionam como um vetor de crescimento e inovação, usando a tecnologia para lançar novos produtos, transformar modelos de negócio e redesenhar processos de ponta a ponta. Segundo o estudo, essas empresas tendem a escalar a IA com mais rapidez, integrar a tecnologia aos fluxos de trabalho centrais e envolver ativamente a alta liderança nas decisões, o que aumenta a probabilidade de impactos positivos no lucro operacional.

Outro diferencial dos high performers está no nível de investimento e foco estratégico. O levantamento mostra que essas organizações destinam uma parcela significativamente maior de seus orçamentos digitais à IA – frequentemente acima de 20% – e priorizam casos de uso com potencial claro de geração de valor, em vez de projetos isolados ou puramente experimentais. Ao mesmo tempo, elas investem mais em capacitação interna, governança e gestão da mudança, criando uma narrativa clara sobre como a IA contribui para o futuro do negócio.