No cenário brasileiro, 2023 não foi um bom ano nem no venture capital, nem na parte de fusões e aquisições (M&As). Já 2024 mostrou uma reação em relação aos números áridos do ano anterior, mas ainda estão longe dos patamares históricos de 2021 e 22. Isso é o que aponta um relatório divulgado pela Questum.
De acordo com o Deals Report 2024, que fechou a conta do ano passado com os números de M&As do segundo semestre, 2024 terminou com 191 deals, ficando consideravelmente acima dos 145 M&As anotados no ano anterior. Só para fins de comparação, em 2021 foram 309 M&As registrados, e em 2022 foram 246.
Segundo a Questum, a queda em relação aos áureos tempos de juros mais baixos e investidores mais animados não precisa ser vista com pessimismo, já que os números de 2024 ficaram bem acima do período pré-pandemia. Por exemplo, em 2020 foram 153 M&As e em 2019 foram 83.
De acordo com a responsável pelo estudo, o que se vê é uma correção do mercado à realidade de um país com as características do Brasil, com juros altos e incertezas das políticas públicas, chegando a um meio termo entre o pré-pandemia e o contexto pós-pandemia de alta liquidez de 2021-2022.
“Ainda assim, os números tendem a se estabilizar em patamares consideravelmente maiores do que no cenário de 2019 em termos de quantidade de transações de M&A, o que consideramos promissor e enxergamos como um salto de maturidade do mercado de M&A de tecnologia no país” destacou a Questum em seu report.
Setores em alta
De acordo com o estudo, os setores que mais apresentaram transações no segundo semestre de 2024 foram o de TI e ERPs, com 45 deals. O setor de fintechs ficou em segundo lugar, com 30 negociações, e marketing e vendas em terceiro, com 16 deals.
Segundo a Questum, os setores mais buscados são os mesmos do primeiro semestre do ano e se destacam por apresentar um maior movimento de inserção da IA em suas soluções, o que evidencia a necessidade de incorporação rápida dessas novas tecnologias por parte das grandes empresas.
“Setores mais tradicionais, como ERP, continuam dominando o número de transações devido à sua ampla capilaridade de atuação e, principalmente, à necessidade de impulsionar o crescimento por meio da consolidação dos mercados em que atuam e da diversificação do portfólio, com novas soluções e inovações”, avalia Guilherme Tossulino, partner na Questum.
Entretanto, outros setores como healthtechs e HRtechs não ficaram muito atrás, com 12 e 11 aquisições, respectivamente. Segundo a responsável pelo o estudo, ambos os setores estão aquecidos por sua necessidade de soluções específicas, e no caso das HRTechs, um movimento de consolidação dentro do setor.
Quem está comprando?
Outro fato interessante apontado pelo estudo, é que em 2024 aconteceu, mesmo que de forma tímida, o retorno do apetite no lado dos chamados “compradores seriais”. Um exemplo citado foi o da Selbetti, que no ano passado fez 5 deals, investindo mais de R$ 80 milhões nestes negócios.
Outros nomes citados foram os das empresas de ERP que estão na corrida para alcançar a líder Totvs no setor – e estão investindo pesado no crescimento inorgânico para isso: é o caso da Sankhya e Senior, ambas com 3 deals fechados em 2024. Fechando o topo do ranking, também com três M&As, vem a nstech, que está investindo pesado para montar um ecossistema ponta-a-ponta de soluções logísicas.
No setor financeiro, o nome destacado foi o da Celcoin, que captou uma rodada de R$ 650 milhões em 2024, e aproveitou para fazer duas aquisições no ano: a Reg+, de soluções de compliance, e a CobranSaas, especializada em cobrança e gestão de carteiras de crédito.
“Observamos em todo o ano de 2024 o surgimento de novos compradores seriais. Por um lado, os consolidadores usuais do mercado passaram a ser mais seletivos, inclusive tendo de dedicar tempo e atenção aos esforços de consolidação e captura das sinergias de aquisições dos anos anteriores. Por outro lado, novos grupos de consolidadores surgem, apostando na via de crescimento inorgânico para expansão de suas operações”, destaca Leopoldo de Lima, partner da Questum.
Agora, os poréns nos M&As
Apesar do leve aquecimento do mercado de M&As, a Questum trouxe as suas ressalvas. Para os founders com startups de valuation mais altos à procura de compradores, a notícia não é boa. Dos 191 deals, apenas apenas 21 deles passaram da marca dos R$ 100 milhões.
Segundo Anderson Wustro, partner da Questum, esse dado sugere que, embora grandes transações recebam mais atenção, a maior parte do mercado de M&A se dá em faixas de valor menores. Uma possível hipótese para essa predominância é o fato de que ainda há poucas empresas no ecossistema de startups que atingem níveis de receita e maturidade que justifiquem valuations mais elevados.
“Assim, os compradores acabam priorizando aquisições estratégicas em estágios intermediários, antes que as empresas escalem a ponto de exigir cheques maiores”, completa o analista.
Para fechar, uma informação para animar. Ao entrevistar as empresas no buy-side, o levantamento constatou que 86% delas pretendem adquirir empresas nos próximos 12 meses. Segundo as respondentes, os principais focos estão na busca de acqui-hires e novas features (uma tendência crescente em tempos de inteligência artificial), seguidos de aumento de base de clientes e receita.