Ter alguma coisa com inteligência artificial virou um imperativo para as empresas nos últimos dois anos. Na corrida para não perder o bonde e correr o risco de ser taxado como retardatário, o que não falta é gente encontrando solução para depois descobrir um problema de verdade.
Foi justamente tentando evitar esse erro que a Mara, supermercado online criado pelos ex-99 Danilo Mansano e Ariel Lambrecht, desenvolveu o comparador de preços pelo WhatsApp batizado de ComparAI. Por mais que pareça uma modinha – bot no WhatsApp quem nunca! – o serviço nasceu de uma questão bastante complexa do negócio: como fazer a expansão da operação para além da cidade de São Paulo sem ter que investir rios de dinheiro de antemão.
A resposta: ter um serviço de baixo custo que ajuda a sentir a demanda e planejar qual o melhor lugar e o melhor momento para dar o próximo passo.
A pessoa manda uma mensagem para a ComparAI com um texto, áudio ou até a imagem de um produto junto com seu CEP e o buscador encontra os melhores preços em estabelecimentos próximos. Com o uso de IA, são cobertos mais de cinco milhões de itens em mais de mil estabelecimentos. Ela também gera uma imagem com descrição do produto consultado, valores e a distância do local onde é vendido.
Vendedores podem se cadastrar para entrar na lista de pesquisa de preços, assim como consumidores podem sugerir a inclusão de lojas na lista pesquisada – é só mandar uma mensagem para o ComparAI com o nome e localidade da loja.
Detalhe: a Mara não ganha nem um centavo nessa história. O uso do bot é gratuito e os vendedores não pagam nenhum tipo de comissão a ela. “A ideia não é vender mais. É utilidade pública”, diz Danilo Mansano, cofundador e CEO da Mara. Mas os dados das pesquisas feitas pelos consumidores, é claro, vão gerar os insumos para o planejamento do avanço nacional da operação.
Recém-lançada, a busca no ComparaAI está disponível apenas para a região metropolitana de São Paulo. Belo Horizonte, Fortaleza, Rio e Salvador receberão o serviço em breve, segundo Danilo. Não há um prazo definido para a decisão de construir um novo centro de distribuição.
Isso não quer dizer, no entanto, que o plano não esteja em andamento. Em paralelo ao lançamento do ComparaAI, a Mara vem fazendo pilotos de parcerias com redes de atacarejo para aproveitar a estrutura que eles já têm pronta. Na avaliação de Danilo, a aliança com a startup é interessante para redes já estabelecidas por conta da baixa digitalização desse mercado.
De acordo com ele, 90% da base da Mara nunca tinha comprado online, mas praticamente todos fazem compras no atacarejo. “O faturamento da categoria de comida no online é muito pequeno no Brasil. No Carrefour ela representa só 2%. Quem vai ganhar esse mercado é o primeiro atacarejo que tomar a decisão de se digitalizar”, avalia.
Hoje a companhia tem um centro de distribuição na Zona Oeste de São Paulo que opera 24 horas e também é sua sede. O CD tem um estoque de menos de 30 dias de produtos – o que equivale a algo entre R$ 700 mil e R$ 1 milhão em mercadorias.
As compras podem ser enviadas para a casa do comprador com frete de R$ 9,99, ou grátis nos pedidos acima de R$ 199. Também há a opção de retirada em uma rede de 500 pontos em 37 cidades da região metropolitana de São Paulo.
Em operação há dois anos, a Mara começou atuando na Zona Leste da capital paulista com apenas 500 produtos oferecidos (SKUs). O foco era em itens da cesta básica. Nada de frutas, legumes e verduras (FLV), nem de congelados. “Não tínhamos a tecnologia nem entendíamos como era isso”, conta Danilo.
Investindo em uma equipe mais sênior e no desenvolvimento de tecnologias proprietárias, a operação chegou a 60 funcionários e perto dos 40 mil clientes. Destes, mais três são assinantes do Clube Mara, que dá acessos a produtos exclusivos, descontos adicionais, cashback e frete grátis em pedidos superiores a R$ 149. A anuidade custa R$ 99, com pagamento adiantado, o que ajuda a companhia a ter uma folga no fluxo de caixa. O Clube também tem clientes corporativos. São 20 empresas que oferecem um benefício de até 30% de desconto nas compras feitas por seus funcionários.
O modelo inspirado na Costco, deu super certo, segundo Danilo: a retenção de clientes dobrou, e o tíquete médio triplicou, indo para lago em torno de R$ 700 a R$ 800. Segundo ele, esse ativo tem sido importante também nas conversas de parceria com os atacarejos.
Steady, as she goes
Tendo passado por 99, Uber e Grow, Danilo viu de perto o que é a vida de queimar dinheiro para tentar fazer uma empresa dar certo. Assim, foi montar a Mara com Ariel Lambrecht, a decisão foi por evitar erros do passado. Por isso, desde a concepção, a Mara opera de forma mais frugal, sem depender de recursos externos para sobreviver. Até agora a Mara só fez uma captação, de US$ 6 milhões, com Canary e Caffeinated Capital.
Ao adotar a premissa do ritmo lento e constante, a Mara foge da cartilha que foi criada para startups B2C e não oferece cupons, não trabalha com produtos com margem negativa e não faz marketing de performance. “Queremos criar valor de verdade”, reforça Danilo.
Com sua proposta de preços baixos, a Mara tem um apelo mais forte nos públicos das classes C e D. Mas o fundador diz que não há uma limitação de público. “As pessoas querem pagar mais barato independentemente da classe social. E o que a gente quer é fazer um negócio de massa mesmo. Não de nicho”, reforça.