O ano de 2024 começou com a expectativa de trazer a tão aguardada janela para listagens de empresas nas bolsas de valores. Mas já estamos em junho e ela continua fechada. E esperar por este momento talvez não seja a melhor estratégia. “Se alguém espera por isso aqui, pode ficar esperando”, disse Felipe Nobre, do multifamily office Jera durante o VC Vision, evento realizado pelo Cubo na sexta-feira (14), do qual o Startups foi media partner.
De acordo com ele, isso acontece não só pelo cenário de juros mais altos, mas por uma mudança de perspectivas sobre liquidez no mercado, com as famílias e investidores criando estratégias de investimento de longo prazo, ou de aplicação de dinheiro perpétuo. “Tem menos de quatro mil empresas listadas nos EUA e tem 50 mil dentro de fundos. É óbvio que não vai ser via IPO que vai ter liquidez”, acrescentou.
Segundo Ivana Ferreira, que comanda as listagens de empresas latinas e do Sul dos EUA na Nasdaq, há 92 empresas esperando pela chance de fazer uma oferta pública. A expectativa é que a fila comece a andar no 4º trimestre do ano. Mas a barra para chegar lá está bem mais alta.
No atual cenário, uma empresa precisa estar em um patamar de receita da ordem de US$ 400 milhões. O montante é quatro vezes maior que os US$ 100 milhões necessários no boom de 2021. Outro exemplo de como a barra aumentou é que mais de 70% das empresas que fizeram seu IPO há quatro anos ainda negociam abaixo dos valores daquele momento.
Outra mudança é que a estratégia de levantar dinheiro para crescer a todo custo não cola mais. A busca agora é por negócios mais estruturados, que consigam, pelo menos, indicar caminhos para a escalabilidade e a sustentabilidade. “O indicador que tem que ter em mente é ser previsível. Tem que ter consistência nos resultados”, disse. Segundo ela, não mostrar isso pode levar a um desconto na faixa dos 30% em termos de valor de mercado.
Falando em valuation, durante o VC Day, da ABVCAP, na segunda-feira (10), Pedro Pereira, que lidera o acompanhamento do mercado de tecnologia na América Latina no Bank of America, comentou que, de uma lista de 40 empresas de tecnologia de alto crescimento que o banco segue na América Latina, apenas 10 teriam condições de manter, após a abertura de capital, um valor superior aos US$ 1 bilhão que lhes é atribuído no mercado privado.
Das companhias latinas listadas em bolsa hoje, duas representam mais de 70% do valor de mercado total. Pedro não deu os nomes, mas não é difícil deduzir que ele falou de Mercado Livre e Nubank.
Ainda há esperança
Os IPOs costumam ser uma importante referência para o mercado de investimento principalmente por dois motivos. Primeiro porque fazem o dinheiro circular. Quem estava em uma companhia tem um retorno sobre o capital aplicado ali por um período de tempo e, assim, tem a possibilidade de colocar recursos em novas empreitadas. Além de garantir os bônus dos banqueiros que atuam na operação, o que também ajuda a movimentar a economia.
Outro aspecto importante é que as ofertas públicas marcam no mercado o preço dos ativos, e servem de referência para outras empresas privadas que querem levantar capital ou comprar um concorrente.
Sem IPOs, fica todo mundo parado, em compasso de espera, como estamos vendo atualmente. Mas isso não significa que está tudo perdido. Os investidores estão mais cautelosos, mas ainda estão em busca de boas oportunidades.
De acordo com Ricardo Kanitz, fundador da Spectra – que tem sido um crítico dos altos valuations e da baixa eficiência do capital aplicado na startups e por isso reduziu sua exposição a venture capital – a boa notícia é que não faltam problemas para serem resolvidos. O que, consequentemente, vai exigir soluções para eles.
Ricardo fez uma avaliação do que aconteceu no mercado de venture brasileiro, com o início marcado pelo dinheiro de investidores estrangeiros e a criação de negócios que se impulsionam do uso da tecnologia para crescer – o tech enabled.
O que ele vê surgir agora, são novas histórias e sub-histórias, com a tecnologia tomando um papel central na oferta dos produtos e serviços. “Mais gente indo para tech hardcore significa mais dinheiro para resolver problemas de verdade e ganhar mais dinheiro com isso [posteriormente]”, afirmou.