O investidor de venture capital Pedro Berto está produzindo um evento de grande porte com o objetivo de colocar a favela no radar das startups brasileiras, conforme adiantado em primeira mão para o Startups.
O Favela Summit terá a sua primeira edição no segundo semestre de 2022 e deve acontecer ao longo de dois dias de forma híbrida, ou seja, com audiências presenciais e participações de forma remota. Segundo Berto, o fórum terá como foco a aproximação da favela do ecossistema de inovação: a ideia é fazer com que startups, independente do estágio de maturidade, desenvolvam seus modelos de negócio pensando também nas favelas.
Segundo o VC, que trabalhava na Redpoint eventures e no ano passado se juntou à Volpe Capital, fundo criado pelo ex-Softbank André Maciel, o objetivo é fazer o evento em uma favela de São Paulo, em regiões como Capão Redondo, ou no Rio de Janeiro, na favela do Vidigal ou da Rocinha.
“É preciso fazer este evento na favela. Ainda que seja por um momento breve, já será o suficiente para aproximar os painelistas [do asfalto] desta realidade”, diz o investidor, que busca posicionar a favela não só como consumidora de produtos desenvolvidos por startups, mas também como produtora de mão de obra qualificada.
Neste momento, Berto está em discussões com os atores do ecossistema sobre diferentes tipos de atuação no evento. O investidor está abordando as próprias startups e empresas ditas tradicionais que tem uma grande interação com as empresas da nova economia, bem como fundos de venture capital.
“Nas minhas conversas com colegas de outros fundos, percebo que há uma grande preocupação com o déficit brutal de mão de obra qualificada que temos no Brasil”, comenta Berto, acrescentando que a resolução da escassez de talentos – em específico na área de tecnologia – passa por uma atuação mais proativa por parte dos investidores.
“Não se trata somente de esperar que empresas dos portfólios consigam encontrar os profissionais que necessitam, mas meter a mão na massa e ter uma abordagem mais proativa nesse sentido. Os fundos estão percebendo isso”, diz Berto.
O evento planejado pelo investidor abordará as verticais de healthtech, fintech, edtech e consumo/e-commerce – nesta última, entrarão empresas de logística e aplicativos de delivery. Segundo Berto, a ideia é debater temas como a “uberização” das relações de trabalho e outras questões pertinentes ao ecossistema, de uma forma colaborativa.
Porém, para além das discussões sobre potenciais oportunidades de desenvolvimento de produtos e serviços para – e com – a favela, Berto espera que o evento também seja um fórum em que compromissos serão firmados pelas startups. “A ideia é fazer com que o summit seja como uma Rio+20, um encontro anual onde vamos estabelecer metas e prazos acerca dos temas discutidos e ir calibrando, ajustando os interesses que a favela tem, e como startups podem ajudar a quebrar o ciclo de pobreza”, aponta.
Juntando forças
A ideia para o Favela Summit leva em conta os aprendizados de Berto no projeto Favela sem Corona, que desenvolveu na Rocinha no começo da pandemia. O investidor criou o projeto com seus irmãos, Anna Raphaela Berto, mestre em geologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro que atua como engenheira de software na Loggi, e Clemilson Berto Junior, doutor em endocrinologia que atualmente cursa pós doutorado na Howard University em Washington DC, alma mater da vice presidente norte-americana Kamala Harris.
Com base no modelo sul-coreano de testagem para a Covid-19 e em parceria com startups como a Hilab, healthtech de Marcus Figueredo que desenvolve mini laboratórios de testagem e o Softbank, que fez uma doação para o projeto, cerca de 400 moradores da favela foram testados. Os dados do projeto também informaram iniciativas dos líderes comunitários, que incentivavam a testagem em áreas com alta incidência de casos.
Segundo Berto, o piloto bem sucedido e outras iniciativas relacionadas ao projeto, com empresas como a Bem Care, que viabilizou suporte psicológico por telemedicina, mostram que existem oportunidades para que startups melhorem as condições de vida para moradores de favelas. “Fui juntando as empresas para gerar uma espécie de política pública, mas sem auxílio do governo, e as coisas foram funcionando muito bem”, conta.
O modelo pode funcionar para impulsionar o desenvolvimento da favela em várias outras áreas, aponta o VC. Uma delas é o desenvolvimento de talentos, com edtechs que treinam profissionais usando o modelo de Income Share Agreements (ISAs), em que o profissional só paga o valor referente à sua formação quando é empregado.
“Percebi nesse trabalho durante o início da pandemia que startups podem encontrar formas de ajudar muito as comunidades sem zerar o caixa, ou fazer isso só por caridade”, diz o investidor. “Nossa experiência mostra que é possível fazer com que empresas olhem para a favela como um celeiro de oportunidades.”
Também focado em construir sinergias entre a favela e o asfalto, o empreendedor social Celso Athayde, fundador da Central Única das Favelas (CUFA) e da Favela Holding, deve produzir seu próprio evento relacionado ao tema em 2022. Há algumas semanas, Athayde falou com o Startups sobre seus planos para um fundo que deve investir em startups nascidas na favela, ou focadas nas necessidades de comunidades.