No Brasil, desenvolver um mercado de trabalho tecnológico maduro esbarra, majoritariamente, em um obstáculo já conhecido: o acesso à educação. Cerca de 55% dos potenciais talentos dizem que há poucas condições para estudar tecnologia no país e 78% das startups afirmam que existe um grande afastamento entre os jovens brasileiros e as bases de conhecimento para o setor.
Os dados são do Panorama de Talentos em Tecnologia, relatório desenvolvido pelo Google for Startups com o apoio da Box 1824 e da Associação Brasileira de Startups (Abstartups). O estudo ouviu 250 startups em uma etapa quantitativa, realizou 10 entrevistas qualitativas para aprofundar o tema com lideranças de startups e especialistas de educação e tecnológica, e organizou grupos de discussão com pessoas de diferentes gêneros, etnias e de redes de ensino públicas e privadas.
O relatório mapeou três desafios centrais em torno da escassez de profissionais de tecnologia no Brasil. Primeiro, a quantidade de talentos que efetivamente estão à disposição do mercado, considerando que há uma falta expressiva de profissionais qualificados para atender à crescente demanda. “Esse é um problema que tem início muito antes do profissional chegar à empresa ou procurar emprego. É uma defasagem inicial e básica”, afirma André Barrence, head do Google for Startups para a América Latina, em coletiva realizada com jornalistas nesta quarta-feira (31).
Cerca de 89% das startups ouvidas no estudo acreditam que existe uma séria defasagem no ensino de pensamento lógico nas escolas brasileiras. Ao longo dos anos, as lacunas vão sendo ampliadas ao ponto de, no início da vida adulta, o jovem não enxergar carreiras em tecnologia como possibilidade para o seu futuro.
Em paralelo a estes problemas, apenas 7% das startups consideram ter em seus times todas as competências profissionais necessárias atualmente para que o negócio cresça e se desenvolva. Os especialistas de maior demanda são os analistas e cientistas de dados, seguidos por especialistas em IA e Machine Learning, e em Big Data – justamente os profissionais necessários para construir as tecnologias que vem ganhando espaço no mercado.
Gap de talentos
Outro desafio é a senioridade dos profissionais. “Há uma necessidade cada vez maior de especialização e senioridade, que faz com que haja menos espaço para talentos que estão entrando no mercado e precisam de uma primeira oportunidade para se qualificar”, explica André. Para 84% das startups, o mercado de tecnologia brasileiro não desenvolve o número de profissionais sênior que deveria.
“Os talentos no início da carreira demandam tempo e experiência para se tornarem sêniores. Mas as startups precisam de profissionais sênior cada vez mais e em menor tempo, dada as necessidades específicas do desenvolvimento do negócio. Não há número suficiente de profissionais sênior, nem de juniores sendo formado pelas empresas para acessar as vagas de maior senioridade no futuro”, alerta o executivo do Google.
Por fim, o relatório ressalta que há um mercado extremamente homogêneo, com profissionais altamente concentrados na região Sudeste do país, que reúne 62% dos empregos de tecnologia do país, sendo 44% apenas no estado de São Paulo. Além das barreiras regionais, os talentos pertencem a grupos pouco diversos, com pouco acesso de grupos historicamente minorizados e sub-representados.
Cerca de 50% das startups entrevistadas consideram o mercado de tecnologia totalmente ou muito homogêneo em relação à raça, classe, religião e gênero, e apenas 15% o consideram totalmente diverso. Para 57% das startups, o mercado de tecnologia atual é excludente para mulheres e 55% o veem como excludente para pessoas negras.
“Cerca de 60% das startups do país consideram muito importante apoiar questões de diversidade. No entanto, mais de 58% não têm ações ou processos seletivos para esse tema”, destaca Luiz Othero, CEO da Abstartups, em referência ao Mapeamento do Ecossistema Brasileiro feito pela Associação em 2022.
Como resolver?
Entre 2021 e 2025, 53 mil profissionais irão se graduar anualmente (Pesquisa Demanda de Talentos em TIC e Estratégia, Brasscom, 2021), enquanto a demanda projetada é de 800 mil novos talentos (Estudo Bridging the Skills Gap in the Future Workforce, da Accenture), gerando um déficit de aproximadamente 530 mil profissionais no período. A opinião dos executivos é que para mudar este cenário é necessário o envolvimento conjunto de todas as esferas da sociedade, inclusive do setor público e privado.
No total, 92% das startups já concordam que faltam profissionais de tecnologia no Brasil. “Mesmo em um cenário macroeconômico desafiador, as empresas ainda têm a necessidade de contratação para continuarem a crescer”, pontua André. O executivo explica que as recentes demissões em massa e ajustes são um reflexo da conjuntura econômica atual, e não de uma falta de demanda das empresas por profissionais.
Pensando nisso, o Google anunciou que todas as pessoas que se formarem nos Certificados Profissionais da companhia passarão a ter acesso a uma plataforma exclusiva do Bettha.com visando encurtar o caminho entre a capacitação e o mercado de trabalho. A plataforma oferece uma trilha de conteúdo de soft skills e permitirá o acesso prioritário a vagas de emprego anunciadas pelo Grupo Cia. de Talentos, que tenham alinhamento com o Certificado Profissional obtido pelo estudante.
A iniciativa chega para complementar projetos do Google que buscam garantir mais alternativas de acesso, inclusão e capacitação para pessoas interessadas no mercado de tecnologia brasileiro. Entre os programas oferecidos estão o Cresça com o Google, o Capacita+ e Google Cloud Foundations Academy, oferecidos pelo Google Cloud e a parceria com o Instituto Vamo que Vamo.