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Co-desenvolvimento e ganha-ganha: como a IBM trabalha com startups

Impulsionada por um investimento de US$ 1 bilhão, a Big Blue acelera atividades no agro, energia e serviços financeiros

ecossistema
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Com um investimento de US$ 1 bilhão para dinamizar seu ecossistema de parceiros nos próximos três anos, a IBM está apostando na ampliação de seus relacionamentos com startups em mercados como o Brasil. Além de fornecer sua tecnologia para novas empresas, a estratégia da companhia inclui um meio de campo em que startups podem também fazer parte das soluções ofertadas a clientes ditos tradicionais.

Para a IBM, a palavra “ecossistema” diz respeito a um universo de mais de 6 mil revendas tradicionais e integradoras com décadas de parceria com a empresa, em todo o mundo. Startups são o elemento mais recente desta comunidade, e apesar de ainda não terem uma grande representatividade em termos de receita, começam a despontar como parceiros e clientes de relevância.

“Sabemos que o mercado de startups é o que cresce mais rápido”, diz Guilherme Araujo, líder do ecossistema da IBM Brasil, em entrevista ao Startups. “Revendas e integradores vão continuar sendo atores importantes do ecossistema, mas a gente também sabe que os motores de crescimento dessas empresas e das startups são muito diferentes; estamos trabalhando para ter uma pizza melhor dividida [em relação a geração de receita]”.

A Big Blue tem atuado junto a startups brasileiras desde meados de 2015, um trabalho impulsionado pela aceleração da plataforma de inteligência artificial Watson no país, e hoje conta com novas empresas de patamares avançados de desenvolvimento entre seus clientes, como a Stone e o Nubank.

No entanto, ainda há um certo preconceito em relação a IBM na comunidade de startups, que o time de Guilherme busca romper: “Em fóruns e discussões com startups e aceleradoras de diferentes regiões brasileiras, essa questão sempre aparece: ‘Mas a IBM está interessada nesse mercado?’, ou ‘Vocês tem soluções que atendam a esse mercado?’ A resposta é: sim, temos várias”, diz o executivo. “E o nosso modelo mudou: hoje, [o consumo de serviços] é muito mais voltado a subscrição e não mais aquele modelo de licenças perpétuas”, pontua o executivo.

Formas de atuação

A IBM interage com startups de diversos estágios de maturidade através de quatro frentes, como o desafio global Call for Code, que teve a agtech brasileira focada em pequenos produtores Agrolly como vencedora em 2020, além de programas específicos para acelerar o uso de computação em nuvem entre empresas early-stage, junto a aceleradoras. No Brasil, a IBM trabalha com o Inovabra, Ace Cortex e a 100 Open Startups, em São Paulo; a SdP e a FabStart, no Rio; a Distrito, no Paraná, além da Orbi, em Minas Gerais, a AgTech, em Goiás, e o Instituto Caldeira, no Rio Grande do Sul.

Além disso, a empresa tem o HybridTeam, conjunto de consultores e técnicos que criam MVPs com empresas um pouco mais maduras, que tem interesse em trabalhar com elementos de tecnologias IBM. “Estas equipes estão engajadas na construção de soluções diferenciadas para ajudar empresas a escalar em seus mercados”, diz Guilherme.

Outra frente do trabalho da IBM com startups é a área de Open Ventures, dedicada a startups que já atravessaram o “vale da morte.” Estas iniciativas visam ajudar scale-ups, principalmente aquelas com modelos de negócio B2B, com uma pegada de co-desenvolvimento de negócios, que podem também ser úteis para as incumbentes que a IBM atende. “Não estamos falando de centenas de empresas, mas algumas dezenas de startups no Brasil. É um modelo que tem funcionado muito bem, pois é uma forma diferenciada que nós temos usado para ir ao mercado”, diz o executivo da fornecedora de tecnologia.

Scale-ups que estão trabalhando sob o Open Ventures incluem a Descomplica, edtech que usa a tecnologia da IBM para antecipação de recebíveis. Outras incluem a Pipefy, que usa IA e automação robótica de processos em sua plataforma de automação de processos de negócio, e a DrumWave, startup brasileira que hoje está em Palo Alto, Califórnia, que criou um modelo de monetização de dados pessoais.

“Diferente das startups, em que o foco é o consumo da tecnologia, nas scale-ups a abordagem que nós fazemos é: como que eu te ajudo a crescer de forma mais rápida? Como eu te ajudo a chegar, por exemplo, nos grandes bancos? Como eu te ajudo a chegar no mercado do Centro-Oeste, onde você não tem penetração nenhuma? Nessa hora, quando a gente faz esse desenvolvimento de negócio e entende quais são os próximos passos que essas empresas querem dar, a tecnologia naturalmente entra”, explica o executivo da IBM.

Guilherme Novaes, líder de ecossistema da IBM Brasil

Segundo Guilherme, o foco em co-desenvolvimento de negócios tende a ser uma abordagem mais bem-sucedida quando o assunto é vender serviços para startups, e o formato tende a beneficiar as duas pontas. “Temos um portfolio grande, mas não temos todas as tecnologias do planeta. Muitas [startups] tem soluções super práticas que podem ir superbem em vários dos nossos clientes grandes”, ressalta.

Um destes exemplos é a Antecipa Fácil, startup que leiloa recebíveis e antecipa pagamentos para grandes companhias: a startup leiloou mais de R$1 milhão em recebíveis para um grande banco que é cliente IBM, em alguns minutos, resolvendo um grande gargalo para o incumbente. “É um ganha-ganha muito interessante entre as empresas”, diz Guilherme.

Para além do trabalho neste segmento, startups em um patamar superior de maturidade são clientes que trazem um tipo diferente de demanda. “Unicórnios já tem uma área de tecnologia bastante madura e ampla. O foco destas empresas tende a ser soluções que vão resolver questões que aparecem a medida em que crescem e começam a ter problemas de empresas tradicionais, seja pelo crescimento acelerado ou pelas dinâmicas de mercado”, pontua o executivo.

Aproximando startups de incumbentes

Em 2022, o time de startups da IBM deve continuar seu “processo evolutivo”, com base no trabalho feito nos últimos dois anos. “Quando olho a evolução do mercado, acredito que é o momento de expandirmos nossas atividades com base nos alicerces que construímos”, aponta. Isso se traduzirá em um trabalho ampliado junto a startups, incluindo uma nova edição do All for Code acontecendo este ano, a aceleração da atuação de co-desenvolvimento do Hybrid Team e programas específicos para startups, principalmente voltados para aceleradoras.

Em termos de setores de foco, a Big Blue deve intensificar o contato com startups atuantes em eficiência de processos, bem como agronegócio e energia, bem como serviços financeiros. “Também estamos olhando algumas empresas que estão crescendo de forma muito rápida, como QuintoAndar, Loft, unico, Nuvemshop, entre outras. Estamos analisando esse mercado de forma dinâmica, muito orientados pelo o que os nossos clientes estão buscando”, pontua.

Segundo Guilherme, incumbentes normalmente tem áreas de inovação aberta, mas carecem de todos os elementos para fazer estas iniciativas funcionarem de forma a gerar resultados. “Quando eu já levo uma seleção de empresas com soluções diferenciadas para esses clientes, começo a fazer o ecossistema dentro daquela empresa girar”, ressalta.

“Empresas estão olhando muito o ecossistema [de startups], independente da vertical. Há negócios que são mais tradicionais e menos orientados a tecnologia, mas que já perceberam que existem startups de nicho naquele mercado que podem ajudá-la a inovar e crescer de forma diferenciada, melhorar os modelos de atendimento aos seus clientes ou até trazer um a grande mudança operacional”, acrescenta o executivo.

Neste contexto, a IBM quer se posicionar como uma orquestradora da inovação em incumbentes, tendo suas ferramentas de nuvem e IA como instrumentos de transformação digital. “Só que quando a gente começa a tratar uma série de temas com essas empresas relacionadas às nossas tecnologias, vão surgindo outras necessidades que o nosso portfolio não necessariamente atende em sua plenitude”, diz Guilherme.

“Quando apresentamos essas empresas parceiras, é exatamente isso que elas são: elas fazem parte do ecossistema da IBM, e muitas vezes também acabam entrando como a solucionadora de questões e problemas que grandes empresas possam vir a ter”, aponta.

O maior desafio no trabalho da IBM com startups em relação a aproximá-las de incumbentes, segundo Guilherme, é achar um espaço para trabalhar entre a velocidade das startups com o modelo tradicional dos incumbentes atendidos pela Big Blue: “Muitas vezes, estas empresas não estão na mesma sintonia fina. Então acaba que o grande desafio é como aterrissar e coordenar a velocidade e os anseios [das startups] com o modus operandi que a IBM tem [junto aos clientes tradicionais].”

Mas este é um trabalho que requer tempo, segundo o executivo da IBM. “Quando falamos de startups, não podemos ter o pensamento de curto prazo, que é errôneo. Temos que ver essas empresas num horizonte de dois, três anos. Eventualmente, a gente consegue ter resultados interessantes no meio do caminho; mas não é algo que queremos mirar.”