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Depois de amargar a brutal desaceleração do segmento de transportes desde a emergência da Covid-19, a startup francesa de mobilidade BlaBlaCar volta a registrar crescimento em caronas no Brasil. Para responder à novas tendências no setor, a empresa agora planeja novas formas de monetização e produtos para o público brasileiro, e aposta no crescimento de seu marketplace de ônibus.

O Brasil é um dos mercados mais importantes do mundo para a empresa, que tem uma base global de 100 milhões de membros. Com mais de 734 mil passageiros, a startup viu o número de caronas em abril de 2022 ultrapassar em quase 90% o patamar registrado no mesmo mês em 2019 – que tinha sido o melhor ano para a empresa no Brasil até o surgimento da pandemia. Em comparação, a performance em caronas em 2020 foi de -49% e em 2021, a empresa teve um crescimento modesto, de cerca de 4%.

Com uma base de cerca de 12 milhões de usuários registrados no Brasil, dos quais 2 milhões chegaram durante a pandemia, a startup se beneficiou de um conjunto de fatores: “Tivemos um crescimento orgânico de usuários nos últimos dois anos, e também estamos vendo uma retomada das viagens e uma demanda que foi reprimida por muito tempo”, diz Frédéric Ollier, vice presidente da BlaBlaCar para a América Latina, em entrevista ao Startups.

O aumento na base de usuários da empresa também reflete uma busca por formas de reduzir custos em deslocamentos, segundo o executivo. A BlaBlaCar estima que, ao dividir o custo das viagens, tanto passageiros quanto condutores podem economizar entre 50% e 75% em deslocamentos de longa distância.

“Em um cenário em que o Brasil atravessando um cenário econômico desafiador, com a inflação mais alta e o preço do combustível aumentando repetidamente, estamos muito bem posicionados para apoiar as pessoas não só a voltar a viajar, mas economizar quando precisam se deslocar”, pontua.

Monetização e novos modelos de negócio

Neste movimento de adesão a caronas como um modal mais barato de transporte, a startup também registrou um aumento no número de viagens em rotas do tipo “long tail”. Estes são percursos fora das rotas mais populares no interior dos estados, que hoje representam 30% das 30,000 rotas de carona disponibilizadas pela BlaBlaCar.

Este crescimento acelerado de caronas no Brasil apresenta oportunidades para a empresa como a monetização das viagens, prevista para 2023. Segundo o diretor da startup, a ideia é fazer com que passageiros paguem uma taxa de serviço de cerca de 15%.

“Tentamos otimizar em função da maturidade do mercado, mas a monetização costuma ser nesse nível, um pouco mais em países mais maduros”, diz Frédéric. Para viabilizar a monetização, a empresa deve implantar meios de pagamento no aplicativo, mas ainda precisa resolver a complexidade relacionada a aspectos como a cobrança deste fee de usuários que pagam pelas viagens em dinheiro.

“A visão de médio prazo é convergir para uma experiência de pagamento online”, diz o executivo. “Mas ainda existem pessoas que gostam de usar o dinheiro vivo, e provavelmente vamos passar por um momento de modelo híbrido: estamos analisando como isso irá acontecer”.

Além da monetização, a startup também estuda a possibilidade de trazer para o Brasil o BlaBlaCar Daily, serviço usado para o transporte diário para o trabalho (commuting), que foi lançado na França este ano. Segundo Fréderic, o modelo combina subsídios do governo e empresas, bem como uma contribuição de passageiros, e tem tido sucesso no país natal da companhia.

“Quando falamos de distâncias mais curtas, as possibilidades de modelo de negócio são infinitas. Acredito muito no potencial de importar [o modelo Daily], mas não acho que o Brasil está 100% pronto para isso. Por este motivo, vamos continuar focando nas viagens intermunicipais neste ano e em 2023”, ressalta.

Apesar do foco principal da BlaBlaCar no Brasil ser caronas, a empresa tem investido no crescimento de seu marketplace de ônibus, que foi lançado antes de pandemia e hoje congrega quase 140 empresas de ônibus. Enquanto as empresas se beneficiam de um canal diferente de distribuição, a startup consegue aumentar as opções para o passageiro em rotas de viagem com uma abordagem multimodal.

“A oferta de marketplace de ônibus vem para reforçar nossos volumes e enriquecer as opções para os passageiros”, ressalta o executivo, dizendo que não está preocupado com a concorrência de outros players. Empresas que também atuam no business de passagens online incluem a ClickBus, pioneira local no segmento.

“Enxergamos um potencial gigantesco na parte de distribuição, pois 80% do mercado de venda de passagens ainda é offline, portanto existe espaço para crescer sem precisar lutar muito contra outros players online”, diz Frédéric.

Ainda em relação aos planos da empresa no segmento de viagens de ônibus no Brasil – na França, a companhia opera a BlaBlaBus – que nasceu da aquisição da viação low-cost Ouibus, da estatal francesa de transporte ferroviário SNCF – o executivo da startup diz que não há planos de fazer algo parecido por aqui e bater de frente com empresas como a Buser. “A distribuição é o nosso foco: não vamos operar ônibus no Brasil”, ressalta.

A distância média das viagens feitas pelo BlaBlaCar foi de 157km em abril deste ano, a um preço médio de R$38. Entre os percursos mais populares estão as rotas entre São Paulo e cidades como Campinas, São José dos Campos e Praia Grande. A startup tem visto um aumento na adesão ao serviço em cidades do Nordeste, entre João Pessoa e Recife, e entre as cidades do litoral do Rio de Janeiro. No sul do país, em trechos entre Florianópolis e Porto Alegre, a empresa tem visto um crescimento relevante, tanto em caronas, quanto no marketplace de ônibus.

Em relação ao perfil dos usuários da BlaBlaCar no Brasil, cerca de 77% dos condutores são homens. A faixa etária predominante dos condutores e passageiros está entre 25 e 34 anos, que representam 43% da base.

Projeções e liderança no Brasil

Para os próximos meses, Frédéric espera manter a trajetória positiva de crescimento da operação no Brasil, principalmente no segmento de caronas. “Historicamente, nos anos fora da crise, sempre vimos que os volumes atuais nos ajudam a prever o crescimento futuro e nunca há uma desaceleração. Com base nisso, sempre prevemos um crescimento relevante em julho, ficamos nesse patamar, depois crescemos de novo no fim do ano”, aponta.

Em relação ao marketplace de ônibus, a empresa pretende chegar a 300 empresas no portfólio, diz o VP da startup. “Acredito que temos muito espaço para crescer neste segmento. Através da nossa plataforma, empresas [de ônibus] têm acesso a um público digital mais jovem e todas as viações já enxergam isso como uma necessidade”, ressalta, acrescentando que há um escopo para atuar de forma mais próxima das empresas em áreas como marketing e precificação inteligente de passagens.

Para tocar as diversas iniciativas, a empresa conta com um time enxuto no Brasil, de cerca de 20 pessoas. Frédéric teve idas e vindas entre a França e o Brasil, onde atuou por vários meses como country manager, acumulando as funções de Ricardo Leite, que deixou a empresa em fevereiro de 2021 e hoje é COO na edtech indiana BYJU’S Future School. Atualmente, o executivo francês está em seu país natal, de onde lidera as operações para a América Latina remotamente.

“Temos que lembrar que parte da beleza da plataforma BlaBlaCar é um equilíbrio muito bom entre centralização e times locais. Muitas das nossas funções e serviços são baseados na Europa e alavancamos essa estrutura para ter times locais relativamente enxutos e muito eficientes e crescer de maneira saudável. Estamos sempre nesse equilíbrio entre ter um nível de eficiência global e, ao mesmo tempo, um suporte local que ajude nesse crescimento”, diz o VP.

No entanto, a BlaBlaCar está trabalhando para encontrar formas de reforçar a operação no Brasil. Em relação a um novo country manager, Fréderic diz que a companhia já experimentou vários modelos e deve revisitar o atual arranjo no que diz respeito a liderança nos próximos meses. “Por mais complicado que pareça, meses dois últimos anos de improviso conseguimos trabalhar muito bem remotamente. O time do Brasil tem o NPS mais alto da empresa, temos uma energia muito boa na equipe local, que funciona muito bem”, completa.

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