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Em seu 3º ato, Movile que ser mais que “a dona do iFood”

Em seu 3º ato, Movile que ser mais que “a dona do iFood”

Quando anunciou a rodada de série D da Movile em 2014, Fabrício Bloisi deixou claro o objetivo da companhia: ir além da proposta de ser uma fornecedora de produtos e serviços para terceiros. A ideia era se firmar como uma marca criadora de suas próprias marcas. Começava ali, o 2º ato da companhia que nos anos anteriores – em seu 1º ato – fez uma série de fusões e aquisições para consolidar mercado e ganhar escala.

O que Fabrício ainda não sabia na época (ele vai dizer que era tudo parte de uma visão de longo prazo) é que uma de suas apostas daria tão certo, que a companhia, em um determinado momento, teria que fazer de novo o movimento de dizer “mas eu sou muito mais do que isso”.

Claro que estou falando do iFood, o aplicativo de entrega de comida que começou a receber investimento do Movile em 2013. Atendendo 60 milhões de pedidos por mês – um volume (GMV) da ordem de R$ 3 bilhões – ele tem hoje 4 mil funcionários no Brasil e na Colômbia e opera também com compras de supermercados, farmácia e artigos para pets.

O unicórnio dentro do unicórnio ficou tão grande que precisou ser “emancipado” do resto da Movile. O dia a dia da operação é tocado por Fabrício, que passou o comando da Movile para Patrick Hruby em março de 2020 depois 5 meses como empreendedor em residência. As métricas das operações também foram separadas, para evitar distorções – e a sensação de viver sempre sob a sombra do filho bem-sucedido.

“Somos uma empresa que desenvolve teses de investimento. Algumas dão certo, outras não. Quando a gente vê que está pegando tração, a gente investe pesado. O iFood é a operação mais madura do grupo, já deslanchou. E foguete não dá ré. O foco agora está nas outras teses”, diz Patrick.

Segundo ele, o objetivo é que a companhia desenvolva uma ou duas dessas novas teses por ano – ou jet skis, como eles chamam internamente – para sentir como elas evoluem.

Novas apostas

Se o investimento em novos negócios – um modelo muito inspirado no de sua controladora, a Prosus/Naspers – não é uma coisa tão nova para a companhia, o que muda agora, talvez, é o direcionamento para algumas áreas específicas. No caso, 3:

  • fintechs, que começou a receber atenção há 3 anos com o investimento na Zoop e conta também com a Movile Pay;
  • logística e última milha, que entrou no radar no fim de 2020 e já conta com investimentos na argentine Moova e na colombiana Mensajeros Urbanos;
  • e a caçula, a área de jogos, representada pela Afterverse, que nasceu dentro da PlayKids e se tornou uma operação independente em maio com o sucesso do jogo PK XD, que tem 50 milhões de usuários no mundo.

Para Turbinar essas novas áreas – e investir no iFood também, claro -, a Movile anunciou na semana passada um aporte de R$ 1 bilhão feito por sua controladora. Mesmo descontando o dólar apreciado, foi a maior captação já feita por ela, superando os US$ 124 milhões de 2018. “A gente sempre considera várias opções na hora de captar recursos. Dessa vez a Prosus disse que queria bancar sozinha e nós fechamos com ela”, conta Patrick. Além do grupo sul-africano, a Movile tem como investidores a Innova Capital, da Veronica Serra, que conta com grana de nomes como Jorge Paulo Lemann.

Na fórmula de crescimento dos novos negócios estão ingredientes já bem conhecidos do Movile: o desenvolvimento interno e também os investimentos e aquisições. Só nos últimos 3 anos, foram 30 negócios.

A Movile não divulga receita, mas, nos últimos 3 anos, vem crescendo a um ritmo de 80% ao ano – puxada, em grande medida, pelo iFood, claro.

Ano passado, a companhia fez um movimento curioso ao vender seu negócio original, de desenvolvimento para operadoras, para a sueca Sinch. A operação de R$ 640 milhões foi dividida em R$ 355 milhões em dinheiro e o restante em ações. A Wavy fechou o período de 12 meses encerrados em 31 de março de 2020 com receita de R$ 461 milhões e lucro bruto de R$ 130 milhões.

Nem tudo são flores

O crescimento nos últimos anos é incrível mas não veio sem alguns problemas. Com o iFood se tornando tão grande, outros negócios ficaram à sombra. É o exemplo do Maplink. A companhia, que recebeu investimento da Movile em 2013, acabou saindo do grupo e voltou a ser independente em 2019. “O negócio [iFood] tomou proporção muito grande, fica difícil para qualquer um dentro do grupo. Como fundador do negócio, estando lá, esse é o meu negócio, a minha chance de acertar”, disse Frederico Hohagen, cofundador e presidente do Maplink, ao Startups em dezembro/20.

Patrick admite que o aplicativo de entrega consumiu uma atenção desproporcional do grupo nos últimos 5 anos e que, nesse processo, alguns outros negócios receberam menos atenção. Mas destacou que, com a ida de Fabrício para o iFood, isso não deve acontecer mais. “Novas empresas que entrarem não terão o mesmo feedback porque removemos essa questão”, diz.

Um outro aspecto interessante a se acompanhar é como o mercado vai enxergar a Movile oferecendo serviços de logística e fintechs para outras empresas, ao mesmo tempo em que usa essas estruturas para suas próprias operações, mais especificamente para o iFood.

Imagina o Magalu, que também atua com entrega de comida, usando serviços financeiros da Zoop ou entregas da Mensajeros Urbanos? Estranho, né? Mais uma vez, Patrick admite que pode haver sim essa resistência, mas diz que isso não deveria ser uma questão já que existe a separação (chinese wall) entre os diferentes negócios do grupo.