Próxima de completar um ano desde a criação de seu segundo veículo de investimento, a Indicator Capital se movimenta para apoiar empresas brasileiras de alto crescimento no ecossistema de Internet das Coisas (IoT), com potencial de expansão internacional.
Fundada em 2014 por Derek Lundgren Bittar, Thomas Lundgren Bittar e Fabio Iunis de Paula, a Indicator tem presença em São Paulo e no Vale do Silício. O portfólio da empresa tem mais de uma dúzia de startups, incluindo saídas como a Social Miner, empresa de e-commerce vendida em 2020 para a Locaweb. Atualmente, a gestora é a responsável por um fundo de R$240 milhões especializado em empresas early-stage no segmento de IoT e conectividade na América Latina.
A escolha da Indicator se deu através de um edital lançado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Qualcomm Ventures, que ancoraram o veículo com um aporte inicial de R$ 85 milhões. Investidores do fundo incluem Banco do Brasil, Multilaser, Telefônica/Vivo, Lenovo e outros.
Com o veículo, a Indicator se tornou a maior gestora latina especializada em IoT e deve investir em até 30 empresas gerando até R$16 milhões em receita, com cheques entre R$10-15 milhões. Nos últimos meses, o fundo já investiu nas startups Monuv, de computer vision; a CTA Smart, de gestão de combustíveis; a startup de pesquisa e inteligência de preços InfoPrice e a Beegol, que usa telemetria para melhorar conexões de internet. Dois investimentos estão nos estágios finais de negociação e o fundo deve fechar entre seis a sete aportes em 2022.
O segmento de dispositivos conectados é promissor. Segundo um estudo da consultoria McKinsey encomendado pelo governo brasileiro para informar o Plano Nacional de IoT, a estimativa é que o Brasil terá 50 bilhões de dispositivos conectados até 2026. Quando o estudo foi publicado em 2017, foi estimado que este mercado poderia gerar receitas de US$200 bilhões ao ano para o país.
Baseado no Vale de Silício com funções que incluem a identificação de tendências de mercado, Fabio Iunis de Paula é um veterano do setor com mais de três décadas de experiência no mercado de tecnologia em empresas como IBM, Lucent e Intel Capital. Segundo ele, o primeiro fundo da gestora, criado em 2016, tinha uma tese centrada nos pilares da transformação digital, e o fundo 2 é a sequência desta mesma tese.
“Hoje estamos em um tipping point do IoT, de conectar todas as coisas: a curva começou a acontecer e deve se acelerar cada vez mais. Isso se aplica a todas as indústrias: educação, agro, industrial, além de setores tradicionais que utilizam muita tecnologia, como varejo, sem contar as aplicações em cidades inteligentes. Isso apresenta um mundo de oportunidades”, diz Fabio, em entrevista ao Startups.
Acelerando a criação de valor
Os investimentos atuais da Indicator exemplificam a curva de maturidade do mercado de IoT no Brasil. O primeiro investimento do fundo é a Monuv, que coleta imagens de câmeras de terceiros (como placas de veículos), processa as informações na nuvem com análise de dados avançada. A empresa então entrega inteligência para apoiar processos de monitoramento e segurança.
“A Monuv é uma empresa tipicamente do ecossistema de IoT, que transforma equipamentos [analógicos] e os torna inteligentes, conectados na Internet com a possibilidade de gerar insights e automações para e criar novas eficiências e reduzir custos”, pontua Fabio, acrescentando que o fundo é particularmente interessado em plataformas digitais que tragam avanços significativos para ac cadeia de valor.
Por outro lado, o fundo gerido pela Indicator é uma peça-chave do plano nacional de IoT, em que existem quatro setores estratégicos para acelerar a adoção de tecnologias sob a abordagem de “coisas” conectadas. As áreas prioritárias são agtech, indústria 4.0, mobilidade e cidades inteligentes, que inclui abordagens relacionadas à áreas como automação residencial.
Segundo Fabio, cada um dos quatro setores prioritários tem uma série de desdobramentos estratégicos que incluem modelos de negócio que podem ser aprimorados ou criados através da IoT. No agro, por exemplo, o fundo analisa possibilidades antes, dentro e depois da porteira, em áreas desde telemetria e acompanhamento de condições do solo e controle de pragas, até uso de conectividade em logística para o setor.
A função de “radar” do executivo no Vale é uma parte crucial deste processo de análise. Ao mesmo tempo em que a Indicator acompanha as principais tendências, tecnologias e criação de novos modelos de negócio, o time no Brasil interpreta como as novidades podem ser aplicadas por aqui. “Ter feito isso por muitos anos e acompanhado desde o boom da Internet e como certos modelos se adaptam ou não à nossa região ajuda bastante. Afinal, a nossa realidade acaba sendo bem diferente de países mais maduros”, afirma Fabio.
Há uma grande complementaridade entre os sócios da Indicator, diz Fabio. Derek lidera o dealflow e seleciona as oportunidades de investimento, Thomas lidera os aspectos transacionais, com sua experiência em private equity e M&As, enquanto Fabio se concentra na construção de valor no portfólio. “A criação de valor diz respeito à como transformar as investidas em empresas de alto crescimento”, diz o investidor, em referência a uma metodologia proprietária, chamada de Building Value Together.
A metodologia tem quatro frentes principais. A primeira visa conectar empresas com o ecossistema de inovação, um universo que engloba desde outros VCs até institutos de ciência e tecnologia e aceleradoras. O segundo pilar é o que Fabio chama de “mão na massa”, em que o fundo se envolve em aspectos desde conexão com fornecedores de serviços e governança até contratações.
O terceiro pilar tem foco em acelerar a geração de receita e inclui provas de conceito de novos produtos e serviços. Isso inclui a conexões com executivos de empresas que tem grande demanda por tecnologias que apoiem processos de transformação digital. Na última frente, a empresa atua nos três pilares anteriores, com ênfase em expansão internacional do portfólio.
Previsões concretizadas
O Brasil tem um plano para dinamizar o segmento de IoT e a Indicator é um ator importante desta evolução, que, segundo Fabio, está às vésperas de uma aceleração significativa. “IoT é um mercado gigante que terá muitas oportunidades, e temos que nos preparar para isso”, diz o investidor, mencionando setores como a indústria automotiva, que faz cada vez mais uso de dispositivos inteligentes conectados.
Ainda sobre o potencial do mercado, o co-fundador da Indicator nota que as previsões dos primeiros estudos de Internet das Coisas há cinco anos atrás começam a se materializar no Brasil. “Lá atrás, dissemos que essas evoluções ocorreriam com certeza, só não sabíamos em que espaço de tempo”, ressalta. “Hoje, não existe mais dúvida alguma sobre isso, e vemos o mercado acelerando a cada dia.”
“Os preços dos sensores, dos dispositivos para IoT caíram bastante. Existem milhares de novos modelos de negócios que hoje são possíveis por conta desta democratização, com aplicações em todos os setores”, ressalta Fabio, estimando que o número de empresas criando inovações neste espaço é cinco a dez maior atualmente do que quando a Indicator se preparou para participar do edital do BNDES para gerir o fundo.
No entanto, o Brasil precisa avançar em outras frentes para que o mercado de IoT possa deslanchar de fato. Isso inclui uma evolução do ambiente regulatório. “O Brasil acaba demorando um pouco para [fazer com que as leis acompanhem] a adoção de tecnologias”, pontua. “A conectividade também é um ponto fundamental, e está associada com a implantação do 5G e de novas tecnologias: uma coisa é falar de conectividade na cidade e outra é falar disso no contexto do campo.”
A segurança é outro pilar fundamental, diz o investidor. “Essas novas tecnologias digitais têm que ser seguras. Em um contexto macroeconômico de guerra, vemos a importância da questão cibernética e da criptografia. [Não é possível] digitalizar a infraestrutura do nosso dia a dia sem ter uma segurança desde a implantação”, ressalta.
Apesar destes desafios, a Indicator está confiante em sua tese de construção do ecossistema de IoT. Segundo Fabio, a gestora deve produzir “grandes heróis nacionais” que farão a diferença neste mercado. “O Brasil tem potencial e massa crítica para criar empresas multinacionais de IoT. Daqui a um ano, isso estará muito mais claro, com startups se destacando no setor”, finaliza.