O Google Brasil colocou no ar uma ferramenta para facilitar o acesso de vítimas de violência doméstica a serviços de apoio. Ao buscar informações sobre violência doméstica ou termos relacionados, a página inicial da plataforma agora destaca canais de atendimento como a Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180), do Ministério das Mulheres, e o Centro de Valorização à Vida (CVV). A nova funcionalidade já está em operação em países como Índia, México, Estados Unidos e Argentina, e chega ao Brasil após anos de espera.
Embora essa ação do Google seja um avanço, sua demora levanta questionamentos sobre a urgência de ações para apoiar vítimas de violência doméstica. Imagine estar em uma situação de violência e não encontrar respostas rápidas ao buscar ajuda. Essa falta de informações acessíveis pode aumentar a impotência da vítima, que precisa de suporte imediato em momentos críticos.
O Brasil ocupa consistentemente uma posição alarmante quando o assunto é violência contra a mulher, e não é de hoje que dados comprovam a gravidade dessa situação. A décima edição da pesquisa DataSenado, realizada em 2023, mostrou que 30% das brasileiras já sofreram algum tipo de violência doméstica ou familiar. Em estados como Rio de Janeiro (36%), Rondônia (37%) e Amazonas (38%), os índices são ainda mais altos, evidenciando que a violência contra a mulher é um problema crônico no país.
Diante dessa realidade, a pergunta que se impõe é: por que o Google só tomou uma atitude mais prática em 2024, quando o problema já se arrasta há anos? O recurso que agora facilita o acesso a serviços de apoio às vítimas de violência doméstica poderia ter sido implementado há muito tempo. Em um contexto onde as plataformas digitais têm se tornado uma das principais ferramentas de informação para a população, é no mínimo questionável que uma das maiores empresas de tecnologia do mundo tenha demorado tanto para fazer o mínimo: garantir que as mulheres brasileiras tenham acesso rápido e fácil a esses canais de suporte.
Mais alarmante é o fato de que o desconhecimento sobre os direitos e recursos disponíveis às mulheres ainda é enorme. Apenas 24% das brasileiras afirmam conhecer bem a Lei Maria da Penha, e em estados como Piauí, Maranhão e Amazonas, esse percentual cai para 17%. Essa falta de informação e a ineficácia das campanhas públicas de conscientização agravam ainda mais a situação.
Preocupa também que 51% das mulheres acreditam que a Lei Maria da Penha oferece apenas proteção parcial. Enquanto mulheres de estados como Amazonas e Piauí têm uma visão mais otimista, as do Distrito Federal, Rio de Janeiro e São Paulo são mais céticas, com menos de 25% afirmando que a legislação as protege adequadamente. Mesmo com a nova ferramenta do Google, o sentimento de insegurança e a descrença na efetividade das leis mostram que a ação é insuficiente.
A decisão do Google de priorizar essa questão só em 2024 parece mais uma resposta reativa às demandas sociais do que um compromisso real e proativo com a causa. Enquanto vemos empresas de tecnologia tomando ações decisivas em outras áreas, como sustentabilidade e inovação, a luta contra a violência de gênero continua sendo tratada como uma pauta secundária. É irônico que uma empresa que tem como missão “organizar a informação do mundo e torná-la universalmente acessível” tenha demorado quase duas décadas, desde a criação da Lei Maria da Penha, para promover uma iniciativa tão básica.
A violência contra a mulher no Brasil não é uma novidade. São anos de dados, pesquisas e apelos de organizações sociais. O recurso lançado pelo Google em 2024 é bem-vindo, mas não passa de um começo extremamente tardio para uma crise que já deveria estar sendo enfrentada de forma muito mais robusta e colaborativa. Enquanto gigantes como o Google demorarem tanto para agir, milhares de mulheres continuarão vulneráveis, sem o acesso imediato a informações e suporte que podem ser decisivos para salvar suas vidas.