Cada vez mais, as empresas reconhecem a inovação como uma questão de sobrevivência. Mais da metade (52%) delas já considera a inovação como prioridade em suas organizações – um avanço significativo em relação aos 39% do ano passado. É o que mostra a recém-lançada Innovation Survey 2024, pesquisa anual realizada pela consultoria de inovação ACE Cortex, a edtech Future Dojo e a boutique de M&A ACE Advisors. O estudo entrevistou executivos C-level, diretores, conselheiros, gerentes e coordenadores de mais de 300 companhias de 40 setores da economia brasileira, em sua maioria com faturamento anual acima de R$ 1 bilhão.
“Houve mudanças significativas no último ano. Até então, o grande foco das empresas era criar novos negócios, mas no ano passado elas se voltaram muito para o ganho de eficiência em processos internos e monetização dos produtos e serviços. O advento da inteligência artificial foi um motivo para isso, mas também tinha todo o cenário econômico, com incertezas e quedas em grandes setores da economia – o que já faria com que as empresas naturalmente focassem no core business. Agora, há um grande foco em como gerar a eficiência dos negócios usando IA”, afirma Milena Fonseca, sócia e COO da ACE Cortex.
Outro ponto que chama atenção é a mudança de rota em relação à experiência do cliente. Enquanto em 2023 essa era uma prioridade para 46% dos respondentes, em 2024 ela caiu para 29%. Segundo Milena, os dados apontam para a necessidade de encontrar um equilíbrio entre a alocação de capital para otimizar processos internos e o aprimoramento da experiência do cliente em todos os canais disponíveis.
“Por muito tempo as empresas usaram metodologias fixas para entender o cliente, olhando para o que ele precisa e entendendo suas necessidades. No entanto, isso muitas vezes não saía do discurso e não era incluído na estrutura dos produtos e projetos. Não adianta fazer só essas pesquisas se o negócio não consegue ter prontidão para adotar e fazer o que o cliente espera. Não adianta só olhar para o que o cliente precisa e não haver um movimento, nem olhar só para dentro e esquecer o cliente. É preciso ter clareza e prontidão para responder às demandas do consumidor”, avalia a executiva.
Ela acrescenta que, de forma geral, as empresas têm percebido cada vez mais que o cuidado com o cliente vai muito além da área de vendas e marketing. “Temos visto nossos clientes olhando mais para a estrutura interna sabendo que antes tratam a experiência do cliente como algo apartado, e agora começam a considerá-la em toda a cadeia do negócio”, explica.
Estratégias de inovação
Segundo o estudo, as principais prioridades para as corporações a curto prazo são o aumento de receita a partir do portfólio de produtos existentes (35,1%); exploração de novas formas de gerar receita (26,4%); e criação de cultura forte (19%). Os objetivos de médio ou longo prazo são evolução de produtos/serviços existentes (47,1%); desenvolvimento de novos produtos (40%); eficiência operacional e automação de processos (39%); novos modelos de negócios (30,6%); e estratégicas de marketing e experiência do cliente com 29,4%.
Das estratégias de inovação mais utilizadas, os entrevistados destacam a construção de novos negócios com parceiros (joint venture), programas de inovação aberta, jornadas de capacitação em inovação e o modelo de organização por squads. Uma parcela pequena dos respondentes (15,2%) afirma ter maturidade ou capacidade de atuar em Corporate Venture Capital e pouco mais de 20% cita o M&A (fusões e aquisições)
“As empresas ainda focam mais em M&A do que CVC, por ainda terem uma forte necessidade de controle e acreditam erroneamente que capturam sinergias mais estratégias pela fusão e aquisição ao invés do corporate venture capital”, pontua Milena. De acordo com a ACE Cortex, embora o mercado tenha amadurecido em muitos aspectos, a esfera de Corporate Venture Capital ainda é relativamente nova para muitas organizações e tem um caminho de aprendizado e adaptação a ser percorrido.
Dos respondentes que já realizam investimentos em startups, 65,1% utilizam recursos da própria empresa e 38% envolvem-se em parcerias estratégicas. Menos de 20% citam programas de CVC, investimentos diretos do acionista e investimentos de terceiros. No entanto, fica um alerta: ano passado, 60% das empresas não tinham um fundo de investimento dedicado para startups. Este ano, o volume é ainda maior: 71%.
Já quando o assunto é M&A, o cenário é outro. 37% das empresas não possuem uma estratégia clara de fusão e aquisição, e 23% nem sequer planejam fazer M&A. Segundo a ACE, esses números indicam que muitas corporações ainda estão desenvolvendo ou definindo suas abordagens para investimentos estratégicos e fusões e aquisições. Ainda assim, mesmo com essa abordagem cautelosa, 21% dos respondentes já enxergam uma estratégia clara de M&A como uma vantagem competitiva potencial para seus negócios.
Desafios para inovar
Ao analisar os desafios enfrentados pelas organizações na busca por maior inovação, fica evidente a diferença entre as pequenas e grandes empresas. Negócios menores, principalmente aqueles que faturam até R$ 10 milhões por ano, citam a falta de recursos financeiros (46%). Já as companhias com faturamento acima de R$ 1 bilhão, têm como maior desafio a cultura organizacional (52,2%), seguido por aversão ao risco (43,5%) e governança e sistema de gestão (43,5%).
A inteligência artificial, como a grande tendência para os próximos anos, traz também alguns pontos de atenção. “Quando falamos em IA, muitas empresas optam por desenvolver suas inteligências internas, mas existem várias ferramentas prontas e diversas startups que podem ajudá-las a ter o mesmo ganho necessário para um negócio, por um custo muito menor”, destaca Milena. Dados da Innovation Survey deste ano mostram que menos de 40% das empresas trabalham com parceiros para inovação – número que se manteve em um patamar semelhante entre 2023 e 2024.
“A maioria das empresas faz um desenvolvimento muito interno. É importante mudar essa mentalidade de que é preciso criar tudo dentro de casa e começar a pensar quais são os parceiros estratégicos que vão ajudar a alavancar o negócio. As organizações têm que olhar para outros caminhos ao invés de fazer tudo sozinhas, porque hoje em dia existe um cardápio de soluções”, diz a especialista.
De uma forma ou de outra, está mais do que claro que a assumiu um papel ainda mais central no último ano. Mais de 53% das empresas indicaram a IA como a principal tecnologia adotada em seus processos de transformação.
“Temos que tomar cuidado para não ir em um único caminho quando a gente fala de inovação. Tivemos a onda do cloud, agora IA, talvez a próxima seja robótica, e é fundamental ter o equilíbrio entre todas essas pontas e soluções para gerar prontidão e valor para a empresa. Caso contrário, a companhia fica só no que está no hype e não obtém o resultado esperado. Se o financiamento é um problema, coloque parceiros para ajudar. Se cultura interna é um problema, comece a formar as pessoas da sua organização. Não perca o foco estratégico, pois isso é o mais importante”, finaliza Milena.