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“A natureza dos empreendedores brasileiros é de bootstrap, tocando o negócio com capital próprio, mas não por opção”, afirma Pedro Waengertner, cofundador e CEO da holding de venture capital ACE, em entrevista ao Startups. “O Brasil ainda não consegue suprir nem perto do capital early-stage que seria necessário para apoiar todos os empreendedores. Então muitos acabam não tendo acesso a esse capital”, explica.

Quase metade dos empreendedores do país (44,6%) montaram seus negócios com financiamento próprio, sem investimentos externos. O dado é do relatório Founders Overview, feito pela ACE em conjunto com Bhub e a55, considerando a resposta de mais de 200 empreendedores com faturamento anual entre R$ 360 mil e R$ 300 milhões. “Isso impacta em muita coisa, como a taxa de crescimento da startup, que é bem abaixo do que gostaríamos. Uma startup que cresce pouco provavelmente irá morrer ou ter uma trajetória muito difícil”, pontua.

Quando elas chegam na etapa do investimento, 25% prefere a opção do venture capital, seguido de investimento-anjo (15,5%) e corporate venture capital (14%). Mas 36% dos respondentes disseram não ter preferência pela origem do investimento. Das startups que captaram, a maioria estava no estágio inicial. Cerca de 42,5% das empresas receberam cheques entre R$ 300 mil e R$ 600 mil, e 22,5% entre R$ 1 milhão e R$ 3 milhões. Para 13,5%, os valores giravam em torno de R$ 600 mil e R$ 1 milhão; para 13,5%, acima de R$ 5 milhões; e para 9%, entre R$ 3 milhões e R$ 5 milhões.

O CEO da ACE afirma que a companhia está investindo mais este ano do que nos últimos três, apesar da ressaca no mercado de venture capital. “No cenário global de investimentos, que impacta também o Brasil, houve quase um congelamento de aportes a partir da série B. Mas o early-stage, onde a ACE atua, não sofreu uma redução tão forte no volume de investimentos, apenas um reajuste de valuation”, diz Pedro.

Ele diz que no boom no mercado, que aconteceu principalmente em 2021, a holding não via sentido em muitas oportunidades de investimento, por conta dos valuations inflados. “Chegavam empresas, fazíamos as contas e víamos duas possibilidades: ou todo mundo estava descalibrado, ou era nós que estávamos, porque aquilo não fazia sentido. Agora, os fundamentos estão mais fortes”, pontua.

Apesar das incertezas trazidas pela conjuntura macroeconômica, ele observa boas oportunidades. Com o número alto de layoffs, no Brasil e fora, há muito talento de altíssima qualidade disponível no mercado – muitos, inclusive, criando os seus próprios negócios a partir das experiências anteriores. “Estamos apostando nesses founders. Momentos de altas e baixas sempre acontecem e, geralmente, startups relevantes são criadas nos vales e não nos picos do mercado. Estamos apostando nisso e pisando no acelerador, fazendo mais parcerias com os fundadores e criando novos programas de fomento”, explica.

Desde a sua fundação, em 2012, a ACE já realizou aportes em 120 startups, concluindo o exit de 25 dessas empresas. No seu track record também constam mais de 100 programas de aceleração realizados, mais de 1.000 startups conectadas com grandes empresas e 6 novos negócios criados.

Pedro Waengertner, cofundador e CEO da ACE
Pedro Waengertner, cofundador e CEO da ACE (Foto: Divulgação)

O perfil das startups

O setor mais aquecido entre as respondentes era o das fintechs (13%), seguido de healthtechs (8%), edtechs (7%), varejo e e-commerce (6%) e HRTechs (6%). O estudo destaca que os mercados de saúde e educação passaram por um crescimento significativo nos últimos anos, principalmente por endereçarem necessidades criadas pela pandemia, como teleconsultas e ensino à distância.

Do total de respondentes, 7 em cada 10 startups atuam no modelo B2B, oferecendo produtos e soluções para outras empresas, e apenas 15,9% trabalha diretamente com o consumidor final (B2C). Sem muitas surpresas, o sudeste possui o maior número de empresas,  (66,7%), seguido por sul (16,4%), nordeste (10%), centro-oeste (4,6%) e norte do país (1,5%).

“O mercado B2B tem muito espaço para crescer no Brasil, especialmente em momentos de retração, no qual as empresas vão rever os seus orçamentos e podem usar uma solução que resolva suas demandas. Há muito a ser feito nesse setor, já vemos um boom de fintechs e acreditamos que os setores de saúde e seguros terão um grande impacto”, analisa Pedro. Ele cita também oportunidades no setor de energia e inteligência artificial.

Acompanhando a tendência global, as startups brasileiras adotam, em sua maioria, o modelo software as a service (SaaS), por oferecer mais flexibilidade no desenvolvimento e na compra, já que os sistemas são oferecidos na nuvem e acessados via navegador, explica o CEO da ACE. Ele acrescenta que, muitas vezes, a solução é contratada por assinatura, o que ajuda a baixar o custo, e as startups têm como vantagem o ganho de receita previsível.

O SaaS é o formato de negócio preferido para 44,4% das startups ouvidas pela Founders Overview. Em segundo lugar, está o modelo de marketplace, com 13,3%, e em atrás dele, a venda direta de produtos físicos, com 10,7% das respostas.

Mais da metade (51%) dos entrevistados já está na sua segunda empresa e quase 80% possuem sócios no negócio. Mesmo com o cenário econômico incerto e repleto de desafios, a possibilidade de mudar a realidade em que vivem é o que motiva a grande maioria dos founders (72%). Outros destacam o desejo de ter maior retorno financeiro do trabalho (24%) e desejo de liderar (21%).

Traçando soluções

Para o CEO da ACE, o ecossistema precisa, mais do que nunca, criar programas que fomentem a trajetória de crescimento das startups. “Empreendedores que recebem o apoio de incubadoras, aceleradoras, mentorias e outras instituições no início do negócio têm uma taxa de crescimento mais consistente anos depois”, analisa Pedro. A própria holding nasceu como uma aceleradora, com o intuito de apoiar e capacitar os founders logo no início.

“É muito importante, especialmente no Brasil, onde as pessoas enfrentam fatores socioeconômicos como falta de acesso à educação e ao capital. Iniciativas de fomento fazem a diferença, e o ecossistema precisa pensar com bastante carinho em como ampliar essa rede”, afirma. “Especialmente considerando a complexidade geográfica do país. Quando as pessoas estão fora do eixo Rio-São Paulo, ou seja, dos grandes pólos de startup, a densidade de empreendedores e startups é menor, o que afeta a trajetória de acesso das empresas”, finaliza.

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