* Carla de Bona é cofundadora e diretora de Ensino da {reprograma}
Vivemos em um mundo que está em constante mudança. Muitos assuntos que, no passado, não eram considerados prioridades, hoje são pontos essenciais de nossas vidas e, consequentemente, afetam a maneira como lidamos com diversos pontos, desde relacionamentos, tendências de consumo e o mercado de trabalho. Não há mais possibilidade, por exemplo, de uma empresa crescer sem se preocupar com o famoso ESG – sigla do inglês para governança ambiental, social e corporativa.
Diante desta nova realidade, a preocupação com a diversidade e inclusão no mercado de trabalho se tornou um assunto cada vez mais relevante e recorrente. No setor de tecnologia, no entanto, o debate é ainda mais profundo. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres representam apenas 20% dos 580 mil profissionais que atuam no mercado de TI no Brasil.
Já um levantamento feito pela Atlassian, empresa de software australiana, revelou que 95% dos colaboradores das empresas de tecnologia nos EUA são brancos e 75% são homens. Para finalizar o cenário crítico, dentre as empresas citadas na Fortune 500, lista anual publicada pela revista Fortune que contém as 500 maiores corporações dos Estados Unidos, apenas 5 CEOs são mulheres.
Essa realidade pode assustar muitas pessoas, mas tenho certeza que, para quem está na área de TI, nada disso é novidade. O que precisamos trazer para o debate é por qual motivo as mulheres ainda possuem tão pouca representatividade no setor. Já ouvi as mais diversas explicações, desde que elas possuem menos talento para exatas, até que se interessam menos pela área. No entanto, a convivência com tantas mulheres que lutam por espaço, me mostrou que nada disso é verdade. Nós, mulheres, temos interesse e talento, mas nem sempre temos incentivo e oportunidade.
Para ir além da minha percepção da realidade, vou trazer números concretos: a participação feminina no mercado de tecnologia cresceu 60% nos últimos anos, segundo dados divulgados pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Somente em 2021, o Banco Nacional de Empregos (BNE) identificou mais de 12,7 mil candidaturas de mulheres para vagas na área de TI, contra pouco mais de 10 mil, em 2020. Então as mulheres começaram a se interessar mais pela área e, consequentemente, a participação delas no mercado cresceu? Ou seja, no passado, a única questão era o desinteresse?
Posso afirmar com absoluta certeza que não! Há pouco mais de uma década, era quase impossível uma mulher se imaginar em uma carreira bem-sucedida. A realidade nua e crua é que faltam incentivo, equidade salarial e representatividade. Quanto mais mulheres inspiradoras conseguirem construir uma carreira de sucesso, mais outras se interessarão e perceberão que existe possibilidade e espaço.
Também acredito que esse aumento de mulheres no mercado de tecnologia é importante não apenas para a busca por igualdade, mas é essencial para que as empresas cresçam com a certeza de que, quanto mais diversa a sua equipe de colaboradores for, mais a sua empresa conseguirá ter uma visão ampla e real do mundo e, consequentemente, maneiras diferentes para a resolução de conflitos. Ou seja, isso é positivo para todo o cenário: para as mulheres, para o setor como um todo e, por fim, para o crescimento das empresas.
Um estudo conduzido pela consultoria McKinsey, em empresas da América Latina, mostrou que companhias que possuem ao menos uma mulher em seu time de executivos são mais lucrativas; isso porque elas têm 50% mais chances de aumentar a rentabilidade do negócio.
Iniciativas pelas mulheres na tecnologia
Com todos esses fatores, fica difícil de entender por quais motivos as mulheres ainda possuem um espaço tão pequeno no mercado de tecnologia. Sinto que as coisas podem e estão, efetivamente, mudando. O problema é que muitas vezes essas mudanças parecem acontecer de maneira muito gradativa – além disso, o esforço dessas mulheres para entrar no setor ainda é cansativo. É necessário enfrentar muitas barreiras para se manter em pé. Sinto que precisa existir um movimento por parte de todas as pessoas envolvidas na área: desde a formação, até os contratantes e as lideranças das organizações.
É aí que está a importância de iniciativas como a Elas Programam, consultoria especializada em desenvolver soluções para para impulsionar a carreira de mulheres no mercado de tecnologia; ou a Manas Digitais, projeto que realiza práticas de caráter motivacional para promover mais meninas do Ensino Fundamental e Médio a seguirem carreira na área de TI.
Assim como essas, existem outras centenas de iniciativas querendo ajudar na resolução desse problema e, normalmente, são movimentos criados por outras mulheres que estão na área e sentem na pele as dificuldades existentes. Mulheres que já estão no topo, mas não se acomodam, querem trazer outras para perto. Não há dúvidas: quando uma mulher se empodera e consegue ter a sua liberdade emocional e financeira, ela quer trazer outras junto na mesma caminhada de crescimento.
Ainda existe uma longa jornada para chegarmos, pelo menos, perto do cenário ideal: a igualdade, tanto de quantidade de mulheres, quanto de equidade salarial. Mas é um alívio perceber que, finalmente, as organizações estão prestando atenção nessa questão e, de certa maneira, dispostas a ouvir mulheres para resolver esses problemas.
“Não vamos chegar lá se não criarmos uma movimentação, se não forçarmos a barra. Precisamos ser ativistas. Não tenham medo de chegar ao topo”. Essa frase foi dita por Tânia Cosentino, CEO da Microsoft e única mulher latina-americana reconhecida por seu trabalho a favor da sustentabilidade pela Organização das Nações Unidas (ONU), e acredito que seja exatamente isso: mulher, não deixe a síndrome de impostora te dominar, você é capaz de chegar aonde desejar. E, por favor, quando estiver lá, leve outras mulheres com você.