*Por Ludmila Pontremolez, CTO da Zippi
Como mulher na tecnologia, engenheira, empreendedora e CTO de uma fintech, minha jornada reflete os desafios e as oportunidades que moldam o futuro da inovação e da diversidade no setor. Minha trajetória começou com a decisão de estudar engenharia no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), uma faculdade militar reconhecida por sua excelência e, infelizmente, por sua baixa representatividade feminina: nós mulheres representávamos somente 5% da turma. Essa experiência foi apenas o começo de uma carreira em ambientes predominantemente masculinos: saindo do ITA, fui trabalhar em gigantes de tecnologia dos EUA, passando pela Microsoft, NASA e Square, até voltar ao Brasil e começar minha trajetória empreendedora.
No artigo “Some Effects of Proportions on Group Life: Skewed Sex Ratios and Responses to Token Women”, a professora de Harvard Rosabeth Moss Kanter argumenta que, quando minoria em um grupo, as mulheres são vistas como a representação de toda a categoria. Foi no colégio preparatório para o ITA que comecei a me sentir assim: como se carregasse a enorme responsabilidade de representar todas as mulheres em cada uma das minhas ações, sendo uma mulher na tecnologia.
Passei no vestibular em uma das primeiras posições, me formei entre as melhores notas da faculdade, encarei cada fase do meu trabalho com extrema disciplina e dedicação, sempre alcançando destaque em todos os ambientes pelos quais passei. A minha sensação era de que, se eu falhasse, reforçaria os estereótipos que limitam as mulheres; mas, se eu tivesse sucesso, abriria caminho para que todas nós fossemos vistas com mais força e competência. O empreendedorismo para a mulher na tecnologia
No cenário do empreendedorismo tecnológico brasileiro, fundadoras são uma esmagadora minoria: de acordo com o Female Founders Report 2021, menos de 10% das empresas de inovação contam com uma mulher entre os fundadores, o que evidencia o quão restrito à presença feminina é o ecossistema.
No meu caso, a decisão de empreender veio ao conhecer meus sócios, dois homens, com quem fundei a Zippi, uma empresa focada em serviços financeiros para autônomos e pequenos negócios. Assumir o papel de CTO trouxe desafios não apenas técnicos, mas também de autoconfiança: empreender é um processo que envolve vulnerabilidade. “Estar na arena” vendendo nossa visão para potenciais investidores e colaboradores exige muita resiliência, pois as rejeições são constantes.
Como mulher na tecnologia, liderando uma área inteira, o sentimento de não ser suficiente foi uma constante nas fases iniciais da minha trajetória. A baixa representatividade feminina em posições similares só tornava esse cenário mais desafiador. O que mais me ajudou a superar essas barreiras foi contar com uma rede de apoio sólida e engajada: sócios que defendiam minha expertise diante de situações enviesadas – como quando questões técnicas foram direcionadas ao meu sócio, e ele prontamente destacou que eu era a especialista no assunto –, além de outras empreendedoras, mulheres líderes e minha própria família. Somos três irmãs engenheiras, e esse suporte coletivo foi essencial para me fortalecer em cada etapa.
O poder do exemplo
Essas experiências destacam o quanto a representatividade é essencial. Como líder em uma empresa de tecnologia e finanças, sempre busquei inspiração nas trajetórias de mulheres que abriram caminhos em ambientes desafiadores. Ao longo da minha jornada como mulher na tecnologia, histórias de outras mulheres, próximas ou distantes, foram uma fonte constante de confiança – saber que alguém tinha alcançado aquele lugar era um impulso para continuar. Compartilhar esses exemplos de sucesso é fundamental para inspirar e motivar as próximas gerações.
Como empreendedoras e líderes de tecnologia, temos a responsabilidade de não apenas participar dessa onda de inovação, mas de direcioná-la para criar um impacto positivo e duradouro na sociedade. Na Zippi, estamos criando um ambiente mais diverso do que qualquer outro em que eu já tenha trabalhado: na área de Tecnologia, nós mulheres somos 40%. Na nossa pequena bolha de diversidade, as mulheres já não carregam o peso de representar todas as outras.
Minha jornada – do ITA à NASA, e agora como CTO da Zippi – é resultado de uma combinação de oportunidades que tive o privilégio de acessar, muita dedicação, disciplina, horas de preparação nos bastidores e o apoio inestimável de pessoas que acreditaram em mim. Reconheço que meu caminho não reflete a realidade de muitas, mas espero que, ao compartilhar minha trajetória, eu possa inspirar outras mulheres a acreditarem no seu potencial e a ocuparem espaços de liderança em tecnologia e negócios.
Celebro não apenas a minha trajetória, mas a força coletiva de tantas mulheres que têm desafiado as estatísticas e transformado o cenário de tecnologia e empreendedorismo no Brasil.